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“Há um passado no meu presente, o sol bem quente lá no meu quintal”. O trecho da música Bola de meia, Bola de gude, de Milton Nascimento, dá a impressão de que foi feito sob medida para Frei Ervino Girardi, que neste dia 9 de abril completa 100 anos de vida.
Esse frade centenário, que transborda lucidez e vontade de viver, nasceu em 1925, em Benedito Novo (SC). Ele chega a esse fase da vida no ano em que a Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil completa 350 anos de história e a Ordem dos Frades Menores celebra os 800 anos do Cântico das Criaturas.
Certamente, Irmão Sol, Irmã Lua, Irmão Vento, Irmã Água, Irmão Fogo, Mãe Terra e todas as outras criaturas estão felizes por este irmão, que também olha com carinho para a Irmã Morte, pois, como servo fiel de Deus, que segue ainda firme os passos de São Francisco de Assis, crê na vida eterna e vive em paz com isso.
No livro As Confissões, traduzido por Frederico Ozanam Pessoa de Barros, Santo Agostinho diz:
“Mas o que agora parece claro e manifesto é que nem o futuro, nem o passado existem, e nem se pode dizer com propriedade, que há três tempos: o passado, o presente e o futuro. Talvez fosse mais certo dizer-se: há três tempos: o presente do passado, o presente do presente e o presente do futuro, porque essas três espécies de tempos existem em nosso espírito e não as vejo em outra parte. O presente do passado é a memória; o presente do presente é a intuição direta; o presente do futuro é a esperança”.
Neste Ano Jubilar, podemos dizer que Frei Ervino é exemplo de esperança, pois abraçou sua vida religiosa com alegria, com o propósito de evangelizar e propagar a Palavra de Deus por meio de seus exemplos e atitudes.
O frade catarinense chegou a Lages (SC), em 1992, e, em 2019, passou a morar na Fraternidade do Patrocínio de São José, onde ainda reside.
Sua caminhada longa reforça a missão que assumiu desde muito jovem, quando já se sentia atraído pelo carisma e pela espiritualidade franciscana.
Com a ajuda de Frei Laurindo Lauro da Silva Júnior, guardião da casa, Frei Ervino concedeu uma entrevista para o site Franciscanos, na qual falou sobre sua vida religiosa e suas expectativas.
“Nasci próximo de uma capela que era visitada pelos franciscanos da paróquia de Rodeio. Deste modo, desde criança sou influenciado pelos franciscanos. Mesmo na escola, onde estudei e aprendi a ler e a escrever, não eram professoras estranhas, eram as Irmãs Franciscanas Catequistas de Rodeio. Os franciscanos vinham para Santa Maria a cavalo, quando eu era criança. Eles sempre costumavam deixar o cavalo, a mula, no pasto do papai, e assim eu tinha muito contato com esses frades. Conheci muito bem, antes de ir para o seminário, o Frei Bruno, o Frei Agnelo, o Frei Tassiano e outro que era o Frei André, que era surdo do ouvido direito. Todos eles eram amigos lá de casa”.
Nesse passado tão presente na vida de Frei Ervino, algumas histórias marcaram sua trajetória, como é o caso de alguns momentos de suas transferências, mostrando que sempre estava pronto para viver sua itinerância franciscana. “Nunca reclamei e sempre aceitei. Lembro quando fui transferido de Caxias para Jaborá”.
O frade contou que também saiu do Rio de Janeiro e de lá foi para Santa Catarina, onde passou pelas cidades de Joinville, Navegantes e Joaçaba.
“Lá me levaram para o convento. Quando cheguei no convento, quem me recebeu foi Frei Bruno. Depois veio a ordem do Provincial de que eu iria para Rio Negro (PR), no Seminário de São Luís de Tolosa.”
A obediência deste homem centenário revela que o tempo não apagou de sua memória sua missão franciscana de fidelidade. Mas, como um bom filho de Deus, também apreciava seus momentos de lazer em fraternidade, nos momentos de pescaria e de trabalhos na horta.
“Quando tinha uma folguinha, gostava de pescar e mexer com a horta, principalmente na paróquia de Rio Negro; Santo Amaro e Lages, pescava. Em quase toda segunda-feira, eu e Frei Benjamim, com os companheiros daqui, gostávamos de pescar de manhã e no final da tarde”.
Perguntado sobre o significado dos 100 anos em sua vida, Frei Ervino, com muito bom humor, uma de suas marcas mais presentes, respondeu:
“Olha, eu não sei como é que passei 100 anos, como é que passaram tão depressa. 100 anos, será possível mesmo? (risos). E outro ponto: vou me recordar que agora em dezembro, por exemplo, dia 14, fará 79 anos que recebi o hábito. No dia 1º de julho, 73 anos que fui ordenado padre. E em dezembro de 2027, serão 88 anos que saí de casa, que entrei no colégio para querer ser franciscano”.
O frade não poupou palavras, nem ânimo, para falar de sua felicidade neste momento de sua vida:
“Me sinto felicíssimo. Não sei como é que passou todo esse tempo, porque, olhando a minha vida, trabalhando nas paróquias, geralmente eu cuidava das capelas, sábado e domingo. Durante a semana, na paróquia, ajudando o pároco em todo o serviço, atendendo doentes, enterros, bênção de carro e confissões. Aos finais de semana, estava no interior. Não sei como é que tive a sorte de visitar tantas capelas, centenas delas, durante a minha vida. Nunca me senti doente, sempre ia”.
Frei Ervino ainda comentou que as poucas vezes em que não foi às capelas foi porque o mau tempo não permitiu. Mas sempre assumia o compromisso e cumpria.
Em sua fala, confessou: “Agora, aqui, nos últimos anos que estou no convento, estou mais parado. Médicos e operações, mas ainda não estou ‘entre’, não”.
Sonhos e esperança
Esse frade, que está prestes a completar 100 anos, tem sonhos carregados de esperança. A resposta começou com uma boa gargalhada:
“Disseram que agora eu seria transferido para um cemitério. É brincadeira! (risos) Meu sonho é continuar até que Deus me dê vida, na companhia de todos confrades tão bons. Meu Deus, você não sabe quantos confrades bons eu tenho aqui no convento de Lages”.
Em suas palavras de afeto, o frade recordou o quanto seus irmãos confrades o acolheram nos momentos de recuperação das cirurgias, reforçando que a vida fraterna é uma importante característica franciscana. “Devo agradecer a Deus, porque aqui é um pequeno verdadeiro paraíso aqui na Terra”.
Vida em comunhão, em fraternidade, em caminhada guiada pelos ensinamentos de São Francisco de Assis no seguimento de Jesus Cristo. Assim, o frade alegre e cheio de esperança reforça que o tempo é o grande aliado da sabedoria e da perseverança.
Para celebrar o aniversário de Frei Ervino, haverá uma Santa Missa no dia 12 de abril, na Paróquia Nossa Senhora do Navio, em Lages. Após a celebração, a comunidade participará de um almoço comemorativo.
Caminhada de vida
Frei Ervino é filho de Eugênio Luiz Girardi e de Rosa Tambosi Girardi. Nasceu no dia 09 de abril de 1925, na localidade de Santa Maria, município de Benedito Novo (SC).
De uma família de 9 irmãos , 5 homens e 4 mulheres, sentindo-se chamado à vida religiosa e sacerdotal, ingressou em janeiro de 1937 no seminário Seráfico São Luís de Tolosa, em Rio Negro (PR).
Em dezembro de 1946 ingressou no noviciado franciscano em Rodeio (SC). De 1948 a 1949 cursou Filosofia no Convento Bom Jesus, em Curitiba (PR).
De 1950 a 1955 fez o curso de Teologia no Instituto Teológico em Petrópolis (RJ), onde foi ordenado sacerdote no dia 01 de julho de 1953, e lá trabalhou até janeiro de 1955.
De janeiro de 1955 a março de 1959, trabalhou em Duque de Caxias, Baixada Fluminense (RJ).
De março de 1959 a abril de 1962, trabalhou no seminário Seráfico São Luís de Tolosa, em Rio Negro (PR).
De abril de 1962 a janeiro de 1966, residiu em São Francisco do Sul (SC).
De janeiro de 1966 a fevereiro de 1974, exerceu seu ministério sacerdotal em Santo Amaro da Imperatriz (SC).
De fevereiro de 1974 a janeiro de 1986, regressou para Rio Negro (PR), trabalhando nas paróquias Senhor Bom Jesus da Coluna e Nossa Senhora Aparecida.
De janeiro de 1986 a fevereiro de 1992, esteve em Coronel Freitas (SC).
Em fevereiro de 1992, recebeu transferência para Lages, como vigário paroquial na Paróquia Nossa Senhora Aparecida do Navio e, em março de 2019, foi para o Convento Franciscano do Patrocínio de São José, onde se encontra até hoje.
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