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Inter - 75 anos

Patrick Cruz

O Inter e o apelo universal do que é nosso

Imagine que um escritor lageano publique um livro sobre um caso extraconjugal entre uma rica fazendeira da Coxilha Rica e um empresário bem-sucedido, morador do bairro Sagrado Coração de Jesus. Ela deixa o marido, um funcionário público do estado, e foge com o amante para o Paraná, mas as coisas não dão certo. Eles voltam para Lages, onde, sob os efeitos de sentimentos como culpa, remorso, vergonha e ciúme, o relacionamento desanda de vez. 

Agora imagine que esse mesmo escritor publique uma outra obra, na qual conta como um respeitado juiz do Fórum Nereu Ramos recebe uma proposta de trabalhar em outra comarca - Ponte Alta, digamos -, para onde ele se muda com a família. Lá, quando começa a construir a vida na nova cidade, o juiz leva um tombo, fica muito doente e passa a desejar morrer, mas, ao mesmo tempo, luta com todas as forças para continuar vivo. Nessa batalha, ele reflete sobre o que fez na vida que tenha de fato valido a pena.

Nascido no Petrópolis e criado no Bela Vista, esse escritor é lageano por inteiro, do garrão da bota ao prognatismo da queixada. Ele escreveu esses dois livros, e vários outros.

Imagine, por fim, que essas obras, com temas e referências tão presentes em nossas vidas - a Coxilha Rica, o Sagrado, o Fórum, as lonjuras de Ponte Alta - transformem-se em alguns dos maiores clássicos da literatura universal. Ao longo das décadas, dos séculos, o mundo vai ler sobre uma fazendeira, um juiz e a imensidão dos campos de Lages e se identificar com essas pessoas, com esses locais, ainda que esses leitores jamais pisem em nossa terra.

Foi isso que fez o russo Liev Tolstói, um dos gigantes da literatura, seja qual for a época ou o idioma. Ele escrevia sobre coisas e pessoas que estavam ao seu redor, mas com uma voz que falava, e fala, com pessoas de qualquer lugar do mundo. Ao longo dos anos, estudiosos e fãs de Tolstói condensaram esse apelo abrangente de seus escritos na frase “para ser universal, comece por falar de sua própria aldeia”, ainda que Tolstói mesmo nunca tenha escrito esse arremedo de autoajuda em seus livros.

O Internacional de Lages é nosso. Quando ganha, quando perde, e independentemente da divisão em que esteja no futebol catarinense, não há um só clube como ele no mundo. Ele bebe camargo, come bijajica e engole os plural, e isso o faz único.

O Tolstói do Bela Vista, o García Márquez do Conta Dinheiro e Dostoiévski da Gethal escreveriam coisas assim, estou certo. “Somos grandes, os maiores, inalcançáveis”, diriam. “E quem discordar é clubista”.

Gabriel Athayde | Inter de Lages


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