Miséria, calor extremo, falta de recursos e muitas pessoas doentes fugindo da guerra e da escravidão. Essa foi a realidade vivenciada por Bruna Camargo, joaquinense de 27 anos, que em fevereiro participou como voluntária da 2ª Missão África promovida pela Inspirali, grupo de ensino de Medicina no Brasil.
Bruna é estudante de Medicina da Unisul de Tubarão, se inscreveu em novembro e foi aprovada. Ela avalia que a experiência mudou seu entendimento sobre a humanidade.
A Joaquinense passou no processo seletivo e foi selecionada, iniciando a preparação que envolvia arrecadação de medicamentos, aulas de Francês e organização da documentação.
A Missão África é um projeto humanitário que levou estudantes e profissionais da saúde a Benin, em fevereiro deste ano. A iniciativa reuniu 44 participantes, incluindo professores, médicos, estudantes de medicina, egressos e profissionais de apoio logístico e comunicação.
O objetivo era oferecer atendimentos médicos e cirúrgicos em regiões de extrema pobreza, promovendo o acesso à saúde em comunidades carentes.
A jornada teve início no dia 13 de fevereiro, quando o grupo se reuniu em Guarulhos para a cerimônia de posse dos missionários. Com 88 malas repletas de medicamentos e insumos, embarcaram rumo a Cotonou, Benin, com uma escala de nove horas no Marrocos.
Ao chegarem, às 4h do dia 15, foram recepcionados pela irmã Monique, responsável local, e seguiram em viagem terrestre até Adjarra, onde se instalaram na Casa do Voluntário, no Hospital Saint Camille.
A primeira tarefa foi organizar a farmácia, que contou com a maior arrecadação de medicamentos da história das missões humanitárias da Inspirali.
Faltam recursos e tempo para atender todos
Durante os 15 dias de missão, as equipes atuaram em três frentes: cirurgias no hospital, atendimentos psiquiátricos no Centro de Saúde Mental de Avrankou e consultas clínicas nos vilarejos.
O impacto da realidade local foi profundo, com desafios como a falta de recursos médicos, o calor intenso e a barreira do idioma. Muitos pacientes falavam o dialeto local, "Fon", enquanto outros traduziam para o francês, língua também pouco dominada pelos voluntários. Diante disso, a comunicação muitas vezes acontecia por gestos, olhares e empatia.
A escassez de exames e medicamentos exigiu criatividade e raciocínio clínico apurado. Cada consulta se tornava um exercício de urgência, onde as decisões poderiam significar a diferença entre a vida e a morte.
A impotência diante de doenças tratáveis no Brasil era um sentimento constante, agravado pelo tempo limitado para os atendimentos. Muitas vezes, os voluntários precisavam partir sem conseguir atender todos os pacientes, deixando para trás olhares desesperados e esperançosos.
Guerra e pobreza extrema
Um dos momentos mais marcantes ocorreu em Lokpo, um vilarejo isolado na floresta, onde os habitantes, fugindo de guerras e da escravidão, vivem em condições de extrema pobreza.
Ali, a dignidade humana parecia esquecida, e doenças que poderia ser prevenidas, eram comuns. O rio, que servia para hidratação e higiene, também era usado como lixão e local de sepultamento.
Apesar da miséria, Lokpo revelou a grandeza da resiliência humana. Abraços, gestos de carinho e sorrisos sinceros mostraram que, mesmo diante da adversidade, a esperança permanecia viva.
A experiência na Missão África não apenas proporcionou auxílio às comunidades atendidas, mas transformou profundamente os voluntários, despertando neles um novo olhar sobre a vida e a profissão.
O máximo esforço foi insuficiente
Ao retornarem, a reflexão era unânime: o máximo que puderam oferecer ainda era insuficiente diante das necessidades. Cada olhar desesperado de uma mãe buscando ajuda para seu filho, cada paciente não atendido, deixou marcas nos corações dos missionários.
“Relatar a Missão África é um desafio, pois há vivências que palavras não conseguem traduzir. A dor, a gratidão, a solidariedade e o aprendizado se entrelaçam em uma experiência que transcende a assistência médica. Mais do que levar ajuda, retorno com um novo entendimento sobre humanidade, esperança e o impacto que pequenos gestos podem ter na vida de quem mais precisa,” disse Bruna Camargo.
Algumas pessoas foram importantes para o andamento da Missão África, como o médico ginecologista obstetra de Florianópolis, Rodrigo Nunes, mentor da equipe, que participa e organiza missões há muitos anos.
Também merece reconhecimento Indrya Coimbra, responsável pela comunicação da Inspirali; e José Dirceu Costa, que fazia a logística na missão, era responsável por comandar a cozinha e levar as refeições nos locais de atendimento das equipes. Era considerado um pai que colocava a casa em ordem.
Fotos: Raphael Martinelli
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